quinta-feira, 17 de junho de 2010

Resenha : Relações humanas na escola de Agostinho Minicucci

MINICUCCI, Agostinho. Relações humanas na escola. 2.ed. São Paulo: Melhoramentos, 1968.

Maria Angélica Correia BAía


Nas relações humanas o perigo é coisa de todos os dias. Deves precaver-te bem contra este perigo, deves estar sempre de olhos bem abertos: não há nenhum outro tão frequente, tão constante, tão enganador! (...) O homem, esse, destrói o seu semelhante por prazer. Tu, contudo, pensando embora nos perigos que te podem vir do homem, pensa também nos teus deveres enquanto homem.
(Séneca, in 'Cartas a Lucílio')


Professores têm culpado os pais por não darem educação aos filhos; alunos que reclamam das “marcações serradas” dos professores; e diretores que nunca estão presentes; esses são apenas algumas das constantes reclamações do contexto escolar e sem sombra de dúvida provém de séculos atrás. Muitas discussões têm aflorado sobre como estão as relações humanas nos mais diferentes espaços sociais, entretanto no momento, nos deteremos a realidade escolar. Pois, a reflexão deste tema tem aberto os olhos de educadores¹ para a importância das relações humanas, não apenas no processo de ensino aprendizagem, porém para um bom desempenho da instituição escolar como um todo.
Por isso não foi a toa que Agostinho Minicucci professor licenciado em Letras Neolatinas e em Pedagogia, também doutor em Educação e Livre-docente em Psicologia, depois de um período considerável dedicado à docência e livros publicados referentes a dinâmicas em grupo, resolveu escrever sobre as relações humanas na escola. Sem dúvida instigado pelas constantes observações do meio a que estava inserido, associada a inquietude despertada, por exemplo, nas falas de alunos, professores e funcionários das instituições escolares que deixavam explicito o impacto das relações entre os sujeitos, que consequentemente exercia influencia ao ambiente escolar.
Minicici inicia seu livro com uma afronta ao trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas brasileiras, pois segundo ele, muito se assemelha às escolas norte americanas, por coagir a participação dos alunos os reduzindo a dependentes cívicos. Jovens e adolescentes são considerados “vegetais”, dos quais nada na instituição depende deles, extinguindo quaisquer aspirações no desenvolvimento de hábitos básicos em tomar parte da vida em comunidade. O autor cita como exemplo as responsabilidades relativas ao ambiente físico e o bem estar psicológico da escola que são relegados a administradores, zeladores e professores, eliminando toda e qualquer situação que cause experiência ao alunado e o faça refletir sobre as pessoas que vivem numa determinada comunidade e qual o seu papel para um bom desempenho de ordem social.
Ao longo dos capítulos são apresentadas falas recolhidas entre professores, alunos e diretores, em diálogos rotineiros entre si, que servem de gancho para discussões em como se encontrava as relações humanas numa perspectiva social e educacional. Apesar do mesmo ser escrito num período totalmente diferente do que hoje nosso mundo apresenta-se, sem sombra de dúvida podemos nos pegar rindo pela aproximidade das situações relatadas, embora reflitam aspectos que merecem nossa atenção.
Contudo, isso não nos faz esquecer que o olhar do autor se entrelaça em diversos momentos pela carga que o mesmo trás de uma pedagogia um tanto quanto tradicional e tecnicista , como também, sua iniciação a uma nova caminhada com o caráter mais crítico e participativo das práticas pedagógicas. Temos como exemplo, trechos que trazem algumas ideias fechadas sobre a postura do professor relatando o que ele pode ou não fazer em sala de aula, e questionários que a partir de nossa pontuação somos classificados como professores “excelentes”, “regulares” ou na pior das hipóteses nos questionam se realmente desejamos realizar um “trabalho educativo útil”; porém, também encontramos falas referentes ao envolvimento de todos na escola, o iniciação da idéia que não apenas o professor, mas todos na escola são educadores, e a perspectiva que o espaço físico e clima influenciam em todo o desempenho da instituição escolar.
Não há duvidas que as inquietações geradas pelos estudos sobre relações humanas não param e continuam presentes como objeto de pesquisa de muitos especialista. Claro que hoje temos estudiosos mais atuais que trazem novos conceitos que abrem um leque nas discussões sobre as relações como Tomas Tadeu² e Stuart Hall³. Porém para os interessados em entender melhor como se deu esse processo de intermediação o livro “As relações humanas na escola” trás em suas entrelinhas esse período de transições e conflito sobre as ideias que permeiam não apenas este tema, mas o quadro educacional brasileiro. Somos capazes de identificar e refletir sobre o processo de construção do assunto e como grandes pensadores se dispuseram a desconstituir princípios dados antes como verdades absolutas e colocá-las à prova. Realmente é uma experiência interessante!
Contato: angelica.mcz@gmail.com


Referências

ALAGOAS, Secretaria Executiva de Educação. Comitê Gestor do Plano Estadual de Educação. Plano Estadual de Educação 2006/2015. Maceió,2005.
MINICUCCI, Agostinho. Relações humanas na escola. 2.ed. São Paulo: Melhoramentos, 1968.
SÉNECA, in 'Cartas a Lucílio'. Disponível em: http://absurdo.wordpress.com/2009/03/20/cartas-a-lucilio-seneca/ . Acesso em 02 Abr. 2010.

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